O ser humano sempre precisou transcender.
Neste estado, entrou em transe, mergulhou em labirintos de sua mente, transformou o corpo em devoção, perguntou, duvidou, inquietou-se com os sentimentos de vazio, de angústia, de ira, e como diria Pessoa, desassossegou.
E o sentido da vida sempre ali, querendo existir, tomar forma, pulsar no centro do peito.
E os desenhos nas cavernas sugem, e o fogo surge, e os rituais vão transformando sentimentos, e os rituais vão transmutando negatividades, e as sociedades modificam-se, de nomadismos a institucionalizações de modos de vida.
E as religiões vão surgindo, comunidades criam cultos comuns e regozijam-se com a união.
E seres humanos com energia semelhante, povoando diferentes lugares do mundo, vão congregando, catalogando, transformando desejos em rituais, criando simbologias, criando liturgias, criando formas de conexão transcendentais.
E o poder vai estabelecendo-se de inúmeras formas. Hierarquias surgem. Seres humanos mais “controlados” e provavelmente obsecados e egocentrados vão tomando territórios, dilacerando gerações e atacando fragilidades.
E os “istmos” surgem. Juntam indiganações e tentam criar conexões para dizer, viver e respeitar o estado de caos que é a vida humana.
E indivíduos seguem em seus limbos. Outros em paraísos visíveis, monumentos ao ego criados pelos que precisam dele para dizer-se humanos, ou talvez mais ricos, importantes, mais poderosos, mais heróicos, e potentes que simplesmente humanos.
E as lutas acontecem. Seres humanos agridem. Agem raivosos, obsecados, e no fundo tão paralisados e fragilizados quanto suas vítimas.
Verdugos são acusados e raramente aprisionados ou punidos. Seus julgamentos são insuficientes, talvez por que julgar não seja suficiente para curar a dor causada por suas obsessões, pelas obscuras motivações e ações vindas de seus pensamentos egoístas.
A grande maioria segue suas crenças no mundo da reputação monetária. Poucos demonstram arrependimento. O poder dominou seus órgãos de sentimento. Eles são os mesmos que comandam corporações subjugam e escravizam milhares de seres humanos com fome e com a mesma vontade de felicidade deles. Todos adoecidos em um sistema de princípios desumanos.
Nações, multidões, cada um e cada sujeito da humanidade pede espaço para viver.
E os direitos humanos são e estão escritos, muito mais escritos que ditos e vividos.
E muros são construídos. Famílias são separadas. O amor sofre inúmeros trágicos rachas.
O amor, aquela potência ilimitada de eternidade humana, é ofendido, é escondido, é atacado, desaparece.
A abundância vira fome, a prosperidade é acuada com o medo.
Diante das destrutivas formas de pensar e agir dos seres humanos que ignoram e atacam o amor, separando-se das carícias da vida, milhões de seres humanos corajosos juntam-se porque acreditam estar conectados de alguma forma.
Mas todos parecem querer estar próximos do sentido do que dizem vida.
Incansáveis, muitos, mas muitos mesmo (!) buscam o sentido e batalham pela melhor vibração da conexão entre todos.
Outros, muitos tantos outros, aprisionados nos sentimentos que a cultura do ego impõe, dizem estar certos de si mesmos, pisam com a certeza de estar no trilho.
Mas seguem uma linha reta sem contemplar o caminho e não sorriem com o coração.
Não espalham seus gestos de coragem. Acham que o sentido da vida é poder ter.
E tendo tudo o que precisam para viver feliz, tudo o que a eles é oferecido, para cada um, expõem suas faces filtradas da cultura da felicidade, e só!
E os que se juntam em comunidades de construção do sentido da vida, do amor de imensidão, e de transcedência da materialidade que fixa a mente na comodidade e no apego egocentrado, são acusados, inúmeras vezes, pela ignorância.
Porque a ignorância acusa, intolera, “pré-conceitua”, conserva, desrespeita, agride, julga é orgulhosa e tem sede interminável de razão. E ainda enche a vida com a moral aprisionante dos poderosos de seu tempo, sem ter pisado na verdade corajosa da ética.
Queria sorrir para ela, a ignorância. Receber dela um sorriso humano de volta e abraçá-la com quentura de alma. E depois, adoraria pedir sua mão para trocar as melhores energias que temos eu, ela, e todos os seres humanos, todos divinos, todos potenciais deuses da existência de seu tempo e do futuro.
Tenho muitas ignorâncias para desabafar e transmutar. Tenho muito tempo para viver buscando o sentido, enquanto tento produzir gestos de sentido.
Tenho muita vida para entender. E queria, aqui, compartilhar minha ignorância sem temer.
Falta dizer, então, algo que o caminho ajudou a entender, depois de uma longa e continua caminhada passando por inúmeras formas de sagração da energia de amor e de respeito à sabedoria:
Todo ser humano precisa transcender.
Na lógica dualista de nossos tempos, ele pode transcender de forma construtiva, gerando vida; ou de forma destrutiva, temendo o melhor que pode viver. Pode usar bengalas lícitas, ou ilícitas. Pode adquirir com moeda ou conquistar a partir das melhores motivações.
Pois assim, entre indivíduos e comunidades, a humanidade junta-se em inúmeras formas de cultivo do espírito, da alma, do si mesmo. Em todas elas há uma conexão que está relacionada principalemnte com os métodos de transcedência, de esvaziamento das preocupações, e com uma crença simbólica em algo que todos temos, algo comum e em perpétua transformação.
Seja qual for o método, a comunidade, a energia de conexão, respeitar as opções de quem precisa amor é ser humano.
O fluir do que é positivo é uma energia que transforma o que não faz bem para a humanidade. Para todo e qualquer um.
Ser você mesmo é bem mais que uma afirmação de identidade. É interpretar-se com coragem e viver da forma que quiser. Mas é também aquele sopro da liberdade quando estamos próximos de todo e qualquer ser humano com um gesto amoroso e de indômita vontade de aprender.
Religare é um sentido que nós criamos. E todos os outros também, os sentidos.
São reflexos do pensamento humano, de vontades e formas de ação.
Pois nos tempos de hoje, nas horas de nosso estar, todos podem voltar-se a observar e cultivar um olhar bem mais realista do que imaginamos. Apesar das imposições mediáticas, políticas e dos sistemas de poder, o amor que é imenso está cada vais mais visível. As conexões estão levando multidões de todos os cantos de mundo às reconexões construtivas.
Algo está transbordando a leveza de seus levantes.
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